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Inovação em meio rural rasga novos horizontes
Inovação em meio rural rasga novos horizontes
Carlos Ribeiro
Coordenador editorial da Revista AGRI
A inovação no meio rural pode ser observada a partir de ângulos muito diversos. Pode ter por base a visão dos decisores políticos e institucionais, a experiência e a sua sistematização por parte dos actores territoriais e sectoriais, a análise e o sentido prospectivo das instituições universitárias e dos investigadores ou ainda o olhar peculiar de inúmeras outras entidades e pessoas que influenciam e promovem acções com real impacto no meio rural.
Nesta edição da Revista AGRI propomos ao leitor que faça um percurso por esta diversidade de olhares e enfoques, sem a preocupação de nele encontrar uma plena representatividade nacional em matéria de inovação no meio rural. Trata-se antes de mais de um convite à reflexão e ao debate sobre um tema que está na ordem do dia que sabemos poder ser ilustrado por inúmeras outras experiências e referências.
Politicas públicas reforçam a acção local
Fomos ao encontro da DGADR –
Direcção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural que acentuou a
importância estratégica desta vertente e
destacou casos de sucesso e projectos inovadores que podem inspirar os
que procuram caminhos sólidos para
a inovação.
Registámos com agrado que a
abordagem temática da inovação em meio rural adquiriu um estatuto de destaque
nas Redes Rurais Nacionais e nas plataformas europeias do sector, sendo de
prever que o Novo Quadro de Programação dos fundos comunitários a contemple com
medidas reforçadas de incentivo e de apoio à sua operacionalização transversal
nos programas relacionados com a agricultura e o desenvolvimento rural.
Programa autónomo inviável
Todos nós sabemos que as
condições básicas para a existência de um Programa Autónomo de Promoção da
Inovação no meio rural não estão reunidas porque este tipo de plataforma
voluntarista tem que assentar numa inequívoca relação de parceria e de
cooperação dos actores a todos os níveis do sistema de inovação. Como o sentido
dominante de actuação ainda é o da satisfação de necessidades de grupos de
interesses muitas vezes em competição (apesar das aproximações positivas
realizadas nos últimos anos, as energias em favor de uma maior densidade
colaborativa ainda são dramaticamente deficitárias) prevalecerá uma lógica
utilitarista e individualista na utilização dos recursos. O ritmo será em
consequência mais lento e as acções serão mais espartilhadas e marcadas
certamente por alguma incoerência. O argumento da abordagem transversal da
inovação no conjunto das medidas programáticas irá permitir que muitos dos
efeitos menos positivos das acções pulverizadas fiquem por contrariar e que o
sentido estratégico da inovação estruturante fique por cumprir.
Quando se fala da necessidade
de compromissos na sociedade
portuguesa para impulsionar novas dinâmicas estruturais, aqui está um campo que
justificaria um empenhamento abnegado de todos os que influenciam o meio rural
e que desejam um desenvolvimento sustentável para o pais.
Novas abordagens ao local
A nossa interacção com a
experiência e os conceitos associados ao Museu
Rural Século XXI ao longo dos últimos meses, em Idanha-a-Nova e noutras
localidades do pais, reforçou no nosso seio a convicção que a plataforma
estética e de intervenção territorial da Arquitecta Cristina Rodrigues e de
todos os que a acompanham nesta aventura que mobiliza conceitos como os de
regeneração, identidades e convergências, representa uma nova abordagem que
pode revitalizar o conceito de desenvolvimento local. Nos últimos anos a
valorização do local, sem abandonar uma visão global, ficou prisioneira de
abordagens estritamente politicas ou de natureza ideológica que enfraqueceram o
seu alcance. Os programas ocultos que dominaram a intervenção comunitária de
muitas organizações, visando modalidades de governação e de desenvolvimento
económico alternativos, criaram desconfiança e relegaram para segundo plano a
força intrínseca das comunidades locais. Os efeitos da ausência de
transparência nos propósitos são devastadores a longo prazo.
Surge agora uma oportunidade de
reformulação e de reaproximação ao território com outras ferramentas de análise
diagnóstica e de proposta para o desenvolvimento, que podendo ser motivo para
julgamentos críticos ou rejeições, contém um elevado potencial para a
recomposição dos quadros programáticos de intervenção. A combinação da arte
contemporânea com os temas da ruralidade pode fornecer o tal elemento de
diálogo e de reencontro dos universos rurais e urbanos, que só aparentemente constituem
realidades completamente separadas, distintas e até por vezes opostas.
Inovação tem que ser sistémica
A investigação realizada no
âmbito do projecto RuralInov e
obviamente as suas conclusões representam um novo quadro científico e prático
para a promoção da inovação no meio rural em Portugal. Em coerência com
iniciativas anteriores como foi o caso do projecto europeu Rápido, que
oportunamente tivemos oportunidade de acompanhar, o CETRAD| UTAD e um conjunto
alargado de outras instituições associadas ao projecto, forneceu uma novo
quadro de referência para a interpretação das dinâmicas inovadoras emergentes
no meio rural. Tornou-se mais visível, mais concreto, mais objectivo o sentido
da inovação nos contextos organizacionais e estabeleceu-se uma nova ligação
entre as diversas modalidades de inovação, sendo valorizada a par da inovação
de produto, de processo e de contexto, a abordagem sistémica que garante a
integração indispensável numa leitura orientada para o desenvolvimento.
Conclusões devem ir para o terreno
O que fazer com todo este capital
de recomendação e de propostas para acções futuras é uma interrogação legítima
sabendo-se que muitas das produções realizadas a partir dos meios académicos
não são posteriormente utilizadas
sobretudo pelos actores de terreno que não dispõem de mecanismos de descodificação e de
transposição para os seus contextos específicos de aplicação.
Seria aqui de pensar em instalar
dispositivos de interacção entre estes protagonistas, com sentido prático e
operacional e tendo por base as necessidades e as experiências existentes nos
diversos domínios. Neste campo parece-nos apropriado mobilizar o conceito
wengeriano de Comunidade de Prática e optar por organizar o seguimento dos
processos de estudo no sentido oposto ao convencionado, ou seja, validar as
próprias conclusões da investigação realizada através da sua confrontação
imediata com as necessidades práticas
e candentes dos operadores da inovação em curso.
Novas referências metodológicas
A nossa referência nesta edição
aos Smart Rural Living Labs é apesar
de tudo reduzida. Mas não poderíamos deixar de mencionar uma das metodologias
mais consistentes e mais promissoras que a nível europeu está a estimular
processos de cooperação criativa e
a desenhar uma nova lógica de trabalho colaborativo, ultrapassando uma das
graves falhas das actividades das Redes que radica na ausência de compromissos
e de trabalho em conjunto na fase da concepção e desenho dos projectos nos
quais as entidades serão posteriormente envolvidas.
A complexidade metodológica dos
Living Labs é bem mais elevada mas fica desde já esta referência do evento
ocorrido em Penela, um Congresso Mundial, que poderá suscitar a curiosidade e o
interesse de todos aqueles que intervêm nesta campo de desafio permanente que é
a inovação, no caso presente, em contexto rural.